Um Ph. D. [eus] da Nomenklatura científica e este blogger

sábado, outubro 07, 2006

Acho que foi Johny Cash, cantor de música country americana, que disse certa vez: "É bom ser odiado pelas pessoas certas". É por isso que transcrevo a seguir a troca de e-mails com um professor Ph. D. de universidade pública paulista. Omito nome e local de trabalho para evitar presente e futuros constrangimentos para ele:

04/10/2006

Prezado Enésio [o meu nome é Enézio, com 'z' e para ser lido como o bordão do Enéas].

Com todo o respeito, mas gostaria mesmo de saber qual o propósito de sua página na internet. Não vejo porque alguém que não faz ciência, ficar colocando materias [sic] tendenciosas a todo o momento sem ao menos se dar ao trabalho de verificar a veracidade dessas.

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Minha resposta:

A razão deste blog é tão-somente lidar com qualquer expressão ou apoio da teoria macroevolutiva que demonstre características de ‘fundamentalismo religioso’ (eu não fui o primeiro a chamar os ultradarwinistas de ‘fundamentalistas’. Esta glória fica para Stephen Jay Gould, um evolucionista sincero e academicamente honesto), tais como mentalidade estreita, intolerância, antiintelectualismo, obscurantismo, ou dogmatismo.

Exemplos das ações nefastas e anticientíficas da Nomenklatura científica:

1. A aceitação e ‘devoção’ da teoria macroevolutiva (TGE) e de um rígido compromisso filosófico ao materialismo, e o fazer ciência não baseado em evidência científica.

2. A intolerância em relação às pessoas que questionam a TGE, e apóiam uma política pública que envolve o ensino somente da evidência que apóia a TGE e o banimento de qualquer evidência científica que poderia desacreditá-la. Isso também se aplica àqueles que afirmam que não existe evidência científica que tenderia a desacreditar qualquer aspecto da TGE.

3. O antiintelectualismo e obscurantismo que se reflete na deturpação da evidência científica (especialmente nos atuais livros-texto de Biologia do ensino médio) relevantes à TGE, o desvirtuamento das posições daqueles que desafiam quaisquer aspectos da TGE, questionando os seus motivos ou focalizando nas suas crenças de tradições religiosas (não se esqueçam detratores que o ateísmo também é uma forma de religião – tem dogmas) em vez de tentarem refutar seus argumentos nos méritos. A expressão mais visível disso são os ataques ad hominem e os argumentos de espantalho. Esses exemplos são mui freqüentes em sites extremamente ideologizados pelo materialismo filosófico posando como ciência.

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Meu nome é xyz e sou cientista na xyz. Longe de mim querer possuir a verdade absoluta. Apenas acho que algumas pessoas ficam deveras impressionadas com o que é colocado na rede e acabam por acreditar em tais desinformações.

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Minha resposta:

Concordo plenamente com o professor xyz – ninguém é dono da verdade, mas as desinformações residem no uso de duas fraudes, uma centenária (os embriões de Haeckel) e outra mais recente (as mariposas de Manchester) encontradas em nossos melhores livros didáticos de Biologia do ensino médio com o aval do MEC e o silêncio conivente da Nomenklatura científica da qual o professor faz parte como soldadinho-de-chumbo.

Eu chamo isso de a 'síndrome de Ricupero' versão darwinizada – o que Darwin tem de bom a gente mostra, e o que tem de ruim a gente trapaceia – vide inúmeras fraudes nesta área científica... O silêncio a respeito disso só foi quebrado quando apresentamos ao MEC uma análise crítica dos livros didáticos de Biologia do ensino médio em 2003 e 2005.

Por que todos os portadores de Ph. D. silenciaram sobre a questão ética e científica por muito tempo? Bem a propósito, louve-se a atitude de um autor Ph. D. – José Mariano Amabis, Departamento de Biologia do Instituto de Biociências da USP (in 'Fundamentos da Biologia Moderna', São Paulo, Moderna, 3ª. ed. revista e atualizada, 2002) que retirou essas duas fraudes do seu livro-texto, mas não menciona nas novas edições por que as retirou... Amabis, bastava dizer que elas eram fraudes e vocês sabiam disso há muito tempo!
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Creio que sua opnião [sic] deveria estar embasada em algo mais concreto e não em materias criacionistas estúpidas. Nós sabemos, e o sr. também, que os criacionistas nunca conseguiram demonstrar um "a" do que propoem [sic]. A evolução é corroborada por milhares de artigos todos os dias o que só aumenta sua confiabilidade no meio,,, alas [sic], evolução é fato e ponto final.

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Minha resposta:

Os pequenos textos colocados neste blog são embasados em pesquisas e artigos extraídos da literatura especializada que indico aos leitores para conferir se o que afirmo é veraz ou não. A regra neste blog é – matar a cobra e mostrar o pau! A evolução, caro Ph. D., ainda continua 'um longo argumento' que ainda não foi cientificamente confirmado no COMO isso se realiza desde o tempo de Darwin.

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Espreo [sic] que osr. [sic] tenha o devido cuidado em apresentar esse tipo de artgio [sic] tendenciosos [sic] ou que pelo menos procure saber o que é realmente verdade.
Obrigado.



Foto: Pavo cristatus

Ph. D., XYZ
Depto. XYZ
Faculdade XYZ – Universidade XYZ

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Minha resposta:

Os artigos são tendenciosos sim – eles mostram nitidamente as insuficiências epistêmicas das atuais teorias da origem e evolução da vida sendo discutidas intramuros por outros cientistas ou deduzidas das conclusões dos seus artigos e/ou pesquisas.

Verdade qua verdade – êta tema complexo, mas simples – verdade é tudo aquilo que corresponde aos fatos. Ponto final!

Respondi prontamente ao professor no mesmo dia:

Prezado xyz,

Seja mais cientista e aponte as minhas falhas no blog que eu vou melhorar ainda mais.

Eu não me embaso em matérias 'criacionistas', mas em textos da literatura especializada a qual você deve também ter acesso. Geralmente eu remeto os leitores para o autor, livro ou pesquisa mencionada. Pela limitação de espaço no blog, os textos são sucintos.

Você poderia me dizer qual cientista 'estabeleceu' o fato da teoria geral da evolução? Eu desconheço, e olhe que me envolvi nesta temática há 15 anos.

Quanto a ser ou não cientista, eu sei que há cientistas que não são acadêmicos e acadêmicos que são cientistas. Epistemologicamente eu posso ser encontrado como sendo partidário da visão de ciência de PKF – Popper, Kuhn e Feyerabend, considerados por muitos como inimigos da ciência por apontarem suas limitações e erros. É o que faço no meu blog.

Desculpe-me, mas eu habito o meu estilo desconstrucionista – com todo o respeito, Ph. Deuses não me impressionam. Obrigado pelo incentivo.

Um abraço pós-darwinista,
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Ele me enviou o seguinte 'pedido de desculpas' [IRÔNICO]:

Prezado Sr.

Na verdade eu me equivoquei e venho aqui, humildemente, pedir-te desculpas.

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Minha resposta:

Ironia detectada, desculpas aceitas mesmo assim pois não guardo mágoas de ninguém, especialmente de oponentes no calor do debate de idéias.

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Não sabia sobre sua [sic – erro de concordância nominal, o certo seria 'tua'] formação em letras, o que descarta a idéia de que possa [sic – erro de concordância verbal, o certo seria 'possas'] entender algo do que lê [sic – erro de concordância verbal, o certo seria 'lês'] sobre ciências biológicas, evolução e afins.

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Minha resposta:

Por esta linha parva de raciocínio xyz acabou de impedir a Darwin de escrever o Origem das Espécies – ele não dispunha de formação acadêmica em biologia, aliás, em nenhuma área sobre as quais se aventurou escrever, mas mesmo assim Darwin ousou escrever sobre o assunto considerado 'mysterium tremendum'. Olha que havia gente muito mais capacitada do que o naturalista inglês. Quanto a Darwin, ele tinha mestrado em teologia.

Isso ia ficar para a minha dissertação, mas já trago ao conhecimento de um público maior. No sistema de educação inglês da época de Darwin você poderia optar em fazer o mestrado com 'honors' (escrever uma dissertação) ou sem 'honors' (cumprir somente os créditos). Qual foi a opção escolhida por Darwin??? Alguém adivinha? Sem 'honors', é claro!

Ah, ia me esquecendo – a maioria dos livros sobre evolução, inclusive o seminal Origem das Espécies foi e é escrita para alcançar o público leitor não especializado. Pelo raciocínio de xyz, os editores não devem publicá-los, pois os leigos, mesmo os inteligentes, não irão entender bulhufas sobre 'ciências biológicas, evolução e afins'...

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Então colega, desculpe-me. Continue escrevendo o que acha [sic – erro de concordância verbal, o certo seria 'achas'] que entendeu sobre algo que nunca leu, a evolução, fato demonstrado através de milhares de artigos peer review até no nível de genes.

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Minha resposta:

Um Ph. D. me chamando de 'colega'? É muita ironia, mas ainda chego lá. Falta pouco, e se a Nomenklatura científica tupiniquim me conceder o 'tacape'... A evolução (as teorias especial e geral da evolução) tem sido a minha leitura há 15 anos. Sou cético localizado da teoria geral da evolução, justamente por não me convencer do que leio nesses 'milhares de artigos peer review'. O que mais tem naqueles artigos é o que Stephen Jay Gould identificou muito bem como sendo 'just-so stories' – estórias da carochinha.

Não ia fazer isso, mas a minha ironia fina me obriga – um Ph. D. com todos esses erros crassos de português? Como é que ele apresenta seus projetos de pesquisas para a CAPES? Alô Veríssimo, ainda há vagas no curso de Português da Madame Natasha?
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Obrigado.

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Minha resposta:

De nada. O prazer foi todo meu, pois os Ph. Ds. tupiniquins estão lendo o meu blog. Isso me deixa bastante lisonjeado.

Encerro este blog com uma antiga citação. Traduzo para os leigos, mas conservo o texto em inglês para os Ph. D.[euses]conferirem:

"Nosso pensamento sobre o mundo ou mundos nos quais nós vivemos e morremos deve acontecer dentro das tradições que tingem as nossas observações e apontam para futuras possibilidades. Não existe discurso observacional teórico neutro que seja de alguma utilidade para nós. Nem há qualquer regra definitiva que nos informe quando nós devemos abandonar alguma tradição aparentemente fracassada. Nesta situação difícil, Feyerabend defende a receita de Mills de proliferação: algumas de suas farpas mais impetuosas são dirigidas contra uma admiração kuhniana ou pós-kuhniana por 'ciência normal', concebida como a aplicação coletivizada de idéias que uma vez foram grandes idéias. Nós não devemos esperar pela contra-evidência antes de começarmos a elaborar alguma teoria vigorosamente nova: a contra-evidência nunca será coletada a menos que nós investiguemos as implicações de tais pensamentos bizarros. O ponto de vista conservador é uma desculpa para a preguiça, a ser rejeitada não porque esteja racionalmente errada, mas como uma forma diferente de vida daquela que as mentes vigorosas preferem. Feyerabend parece até rejeitar o seu antigo amor, explicações materialistas da mente, sob uma base semelhante: "Nós queremos eficiência científica, ou nós queremos uma vida humana rica do tipo conhecido e descrito pelos nossos artistas" – não que Feyerabend creia que a 'eficiência científica' como é geralmente entendida seja genuinamente eficiente. Como qualquer igreja bem estabelecida [SIC ULTRA PLUS!!! Gente, eu chamo carinhosamente de 'Nomenklatura científica', um termo mais secular...] , a comunidade científica é um refúgio para os que buscam posições, e ela somente sobrevive porque o espírito da verdadeira razão levanta testemunhas para si mesma em cada época". [1](Ênfase inexistente)

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Fui, mas volto para fustigar esta atitude arrogante e mentecapta de alguns Ph. D. (euses) da Nomenklatura científica tupiniquim...

NOTA

[1] "Our thought about the world or worlds in which we live and die must take place within traditions that suffuse our observations and point to future possibilities. There is no theory-neutral observational discourse that would be of any use to us. Nor is there any definitive rule that tells us when we must abandon some apparently failing tradition. In this plight, Feyerabend advocates Mill's recipe of proliferation: some of his fiercest barbs are directed against a Kuhnian or post-Kuhnian admiration for 'normal science', conceived as the collectivised application of ideas that were once great. We should not wait for counter-evidence before beginning to elaborate some lively new theory: the counter-evidence will never be collected unless we investigate the implications of such bizarre thoughts. The conservative outlook is an excuse for laziness, to be rejected not because it is rationally mistaken, but as a different form of life from that which lively minds prefer. Feyerabend even seems to reject his sometime love, materialist explanations of the mind, upon a similar ground: "Do we want scientific efficiency, or do we want a rich human life of the kind known and described by our artists" – not that Feyerabend believes that 'scientific efficiency' as common understood is genuinely efficient. Like any well-established church, the scientific community is a haven for place-seekers, and it survives only because the spirit of true reason raises up witnesses to itself in every age." [1]


Stephen R.L. Clark, review of P.K. Feyerabend, Philosophical Papers Vols. I and II; Philosophical Quarterly 34 (April 1984): 172-173.